JOÃO SOARES NETO, CÔNSUL HONORÁRIO DO MÉXICO
E MEMBRO DA ACADEMIA FORTALEZENSE DE LETRAS
José Luís Lira tem caminhado, nos últimos anos, em várias direções. Profissionalmente, escudou-se na sua formação jurídica e galgou o patamar de professor da universidade do vale que circunda a região onde moram seus sentimentos. Paralelo a isso, aportou afinidades com Mathusaila Santiago e dessa amizade surgiram duas academias. A fé gerada enquanto infante o acompanha hoje, pois sedimentada, no estudo hagiológico. E faz mais, amou Rachel de Queiroz na sua velhice e dela extraiu elementos que transformou em livro. E vai em frente. Lira é assim, inquieto, decidido, abridor de portas e de livros com o tempo que sobra aos que optam pela castidade e solteirice. Assim é José Luís. E por ser José Luís imagino-o mexendo no Google a descobrir algo que contivesse os seus dois pré-nomes. E não é que ele descobriu e bem. Surge, em sua vida, a figura beatificada de José Luís Sánchez Del Río, um jovem adolescente mexicano, nascido em 1913 e falecido aos 15 anos.
O processo de canonização de uma pessoa morta passa por quatro etapas. Na primeira, um bispo ou arcebispo que responde pela Diocese em que o candidato vivia abre um processo. Esse lento processo precisa de um postulador, isto é, de alguém que advogue a sua causa, devidamente indicado pelo bispo, pelo menos cinco anos após a morte do servo de Deus em exame. Por outro lado, a Santa Sé procura, detalhadamente, a descoberta de falhas ou lacunas que invalidem a postulação.
Vencida esta etapa, o Servo de Deus, por seu representante, passa a postular ser Venerável, quando é provado a teólogos, historiadores e membros da Igreja que o candidato teve uma vida ilibada com realce para suas virtudes católicas ou que faleceu em defesa da fé em Cristo. A terceira fase é a Beatificação, quando a grande burocracia do Vaticano escoima todas as questões e o “encaminha” à santificação. Foi nesta fase que Lira já encontrou seu homônimo. Para ser Santo, José Luís Sánchez Del Río tem que comprovar ainda que realizou, pelo menos, dois milagres.
Com a argúcia de um “hacker” católico, Lira foi-se apropriando da história da revolução “cristera”, movimento que no final dos anos 20 colocou em cheque as relações entre a Igreja e o Estado Mexicano, originando a morte de milhares de pessoas, dentre elas a de José Luís Sánchez Del Río e viu todo o caminho percorrido até a já beatificação desse adolescente e o fez com o cuidado de um parente na fé cristã e na irmandade que possa advir da feliz coincidência de terem ambos pré-nomes idênticos.
Mais não comento para não tirar o prazer da incursão em percurso tão rico na história mexicana do início do século passado, violenta, estonteante e definida, na forma cautelosa e carinhosa com que Lira cuidou de compor o “Mártir do Cristo Rei: José Luis Sánchez Del Río”. Ele mesmo diz: “O jovem beato José Sánchez Del Río deve estimular-nos a todos, principalmente, a vós, jovens, a serdes capazes de dar testemunho de Cristo na nossa vida quotidiana”. Esse livro-documento, por sua pesquisa, fará certamente parte das leituras e comentários dos que professam a fé católica, os que procuram conhecer a história mexicana, bem como os que integram a Academia Brasileira de Hagiologia, da qual é um dos membros mais atuantes.
Propagar a fé em época tão carente de santidade é um ato de amor a Deus e ao próximo, ao mesmo tempo em que qualifica seu autor no caminho pessoal pelo uso da razão e da pesquisa. Como dizia Santo Agostinho: “Fé é acreditarmos no que não vemos, e a recompensa dessa fé é vermos aquilo em que acreditamos”
João Soares Neto